Suponha-se que a pessoa falecida tenha deixado como herança
um único imóvel a partilhar e quatro herdeiros, todos filhos do finado.
Após a tramitação do inventário, é feita a partilha da
seguinte maneira: cada um dos quatro filhos fica com 25% do imóvel. Com isso, o
bem agora passa a ter quatro proprietários.
Como só um dos irmãos mora no imóvel, instaura-se um
mal-estar com os demais, porque apenas um está utilizando 100% do bem, enquanto
os outros, que detêm 75% da propriedade, pagam aluguel em outras casas e nada
estão ganhando desde a partilha.
Então os outros três irmãos decidem vender o bem, mas o
quarto irmão, que está morando no imóvel, manifesta-se contra a alienação. Ele
alega que também é dono, e, como proprietário, tem o direito de definir sobre o
imóvel, e estipula que ele não será vendido.
Bom, este quarto irmão não tem razão. Com efeito, basta que
somente um dos irmãos queira vender, e, automaticamente, todos os demais
ficarão obrigados a assim proceder.
Nessa situação considera-se que os herdeiros vivem em um
condomínio (mais de um dono) de um bem indivisível (não é possível “retalhar” o
imóvel em uma parte para cada irmão).
Em havendo condomínio, se um dos herdeiros optar pela venda,
os demais não têm o direito de resisti-la, senão o de comprar a parte daquele
(s) que quer (em) a alienação[1].
O que fazer se um dos
herdeiros não aceitar a venda?
Nos termos do que expliquei, ele não poderia não aceitar a
venda. Em o fazendo, a providência a se tomar é a alienação forçada, por meio
de ação judicial.
No processo, o consentimento desse herdeiro será suprido
pelo do (a) juiz (a), inclusive expedindo escritura pública de compra e venda
sem a necessidade de assinatura do herdeiro contrário.
Se não houver acordo sobre a forma de venda do bem, será
feito leilão judicial. Não aconselho enveredar pelo caminho do leilão, posto
que os valores de arrematação costumam ser muito menores que os de mercado.
Ressalto, porém, que não se deve confundir ausência de
consenso sobre a venda com a divergência quanto ao modo de efetuá-la. No
primeiro caso, basta o suprimento do consentimento, enquanto no segundo é que
se chega ao leilão[2]. Dificilmente há dissenso quanto ao método, e sim quanto
à alienação em si.
Há como preservar a
memória desse bem da herança?
Outro aspecto que deve ser levado em consideração é o do
herdeiro que não quer a alienação em razão de desejar preservar aquele bem que
considera precioso, que foi do pai, da mãe, etc.
Friso que um direito assiste a esse herdeiro: o direito de
preferência. Isso significa que ele poderá comprar o imóvel pelo mesmo preço
que uma terceira pessoa oferecer, sem precisar aumentar a oferta.
Se o maior valor achado perante terceiros para a venda for
de R$ 500.000,00, poderá comprá-lo pelos mesmos R$ 500.000,00, sem necessidade
de dar um lance maior.
Pode parecer algo sem sentido, a priori. Entretanto, não é
difícil encontrar verdadeiras birras entre irmãos, nas quais um deles, que
almeje comprar o imóvel, seja interpelado por seus pares no sentido de exigir
dele valor maior que o oferecido por terceira pessoa.
Imagine-se que no exemplo dos R$ 500.000,00 o irmão que
queira comprar o imóvel ouça dos demais: “Ora, mas R$ 500.000,00 nós já
encontramos. Se você quiser adquirir, tem que pagar R$ 510.000,00.”
Como visto supra, este irmão poderá adquirir o bem pelos
mesmos R$ 500.000,00, sem dar um centavo a mais. Poderá fazer isto valer até
mesmo judicialmente.
Não obstante, precisará dispor de dinheiro para isso. Não
poderá impor aos demais herdeiros que mantenham o imóvel sem pô-lo à venda para
preservar as lembranças do falecido, a não ser que estes assim também entendam.
Ora, sendo eles também donos, e conferindo o direito de
propriedade a prerrogativa de dispor daquilo que se é dono[3], de outra maneira
não poderia portar a lei.
[1] Cf. art. 1.322 do CC/2002.
[2] Vide art. 730 do CPC/2015.
[3] Art. 1.228, caput, do Diploma Substantivo Civil.
Fonte: Paulo Henrique Brunetti Cruz, Advogado
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