Calote, cano, cachorro, carro e criança: estes são os cinco
C's das baixarias e conflitos entre vizinhos nos condomínios, segundo advogados
especializados na área. Basicamente se traduzem em atrasos na conta do
condomínio, animais que latem demais, vazamento no vizinho de cima, arranhões
de carros na garagem e crianças em algazarra.
Em boa parte das vezes, os problemas são resolvidos no
diálogo, mas não é raro que a falta de consenso ou de bom senso faça com que
muitos deles acabem parando no Judiciário.
“Nessa comunidade, é sempre necessário conversar, mas, se
nada mais der certo, o jeito é entrar com uma ação mesmo”, disse o advogado
especializado em direito imobiliário Jaques Bushatsky, do escritório Bushatsky
Advogados.
Processos longos, custos altos e mesmo a chance de não
ganhar são alguns dos fatores que ele menciona para serem levados em
consideração antes de levar a briga ao tribunal.
Bushatsky pesquisou dezenas de processos relativos aos cinco
C’s que passaram pelos tribunais de diversos estados nos últimos anos e
analisou para qual lado tendem a pender os entendimentos dos juízes nas
diferentes situações.
Veja a seguir as brigas mais comuns e que desfecho costumam
ter quando se transformam em uma ação judicial.
Calote
Moradores que atrasam o condomínio são, certamente, a maior
fonte de problemas e de processos que saem de um conjunto residencial.
Aqueles que não pagam sua parte no rateio coletivo não só
abrem um buraco no caixa da administração como estão entre as principais causas
de aumento nos valores dos condomínios: quando a inadimplência cresce, sobram
menos pessoas para arcar com os custos comuns, e a conta de cada um sobe.
"Se foi tentado um acordo, um parcelamento na dívida e
nada deu certo, o condomínio acaba mesmo acionando a Justiça", disse
Bushatsky. "Nesses casos, o Judiciário tradicionalmente dá o ganho de
causa para o condomínio e impõe o pagamento dos débitos, seja qual for o
argumento para os atrasos."
Uma vez com a decisão judicial em mãos, há uma série de
procedimentos que podem ser acionados caso o pagamento continue não sendo
realizado, como a penhora de bens do proprietário ou o envio do imóvel para
leilão, até que o condomínio consiga levantar e receber o valor total que lhe é
devido.
Cano
Vazamentos e infiltrações que vêm de outro lugar que não da
sua própria casa são um problema recorrente entre aqueles que dividem paredes
acima ou ao lado com outras pessoas.
Os reais problemas começam, porém, quando o responsável por
aquela mancha molhada na parede alheia --que pode ser um vizinho ou mesmo o
condomínio, no caso de o problema estar na rede geral-- resiste em fazer o
conserto ou até a investigação para encontrar a origem do vazamento.
Nesses casos, muitos acabam optando por buscar a ajuda
oficial. Quando os casos chegam à Justiça, a prática é que o juiz solicite a
realização de uma perícia para localizar o vazamento, detectar os culpados e
emitir a sentença determinando que os responsáveis façam o reparo.
"É uma ação em que o culpado sempre perde, e vai acabar
saindo mais caro para ele resistir e esperar chegar ao Judiciário do que
simplesmente fazer o conserto", afirmou Bushatsky. "Ele vai ser
obrigado a fazer o reparo e ainda arcar com as custas do processo."
Além disso, deixar de fazer a manutenção porque os vizinhos
ou o síndico pediu é uma coisa, mas deixar de fazê-la a partir do momento em
que isso foi decidido no tribunal passa a ser descumprimento de uma ordem
judicial. "Normalmente, são estipuladas multas diárias, com valor que o
juiz define conforme o caso, até que o problema esteja solucionado.”
Cachorro
É justo obrigar sempre a ter o cão ou gato no colo nas áreas
comuns? O cachorro do vizinho incomoda? Sim, essas também são causas que não só
congestionam os interfones das portarias como também acabam chegando às mesas
do Judiciário.
"No geral, os juízes entendem que pode, sim, ter
animal, mas pode haver exceções", disse Bushatsky. Ele menciona o caso de
um morador que foi proibido de continuar com seu pit bull no prédio já que o
cão poderia apresentar riscos à segurança dos outros moradores e dos
funcionários.
Em várias outros processos levantadas por Bushatsky, porém,
as decisões pendem por preservar o direito dos condôminos de circularem com
seus animais. Foram os casos de dois moradores que eram cobrados por seus
vizinhos e pelo condomínio para levarem os animais no colo --um deles era uma
idosa que possuía três cães e o outro um rapaz dono de um golden retriever (cão
de raça grande).
Em ambas as situações, os juízes dispensaram aos
proprietários a necessidade de andar com os bichos no colo pela área comum,
desde que com coleira.
Carro
As situações mais comuns, segundo Bushatsky, são as de
pessoas que chegam à garagem e encontram o carro riscado, batido ou até mesmo
outro veículo no lugar de sua vaga demarcada.
Quando o culpado resiste em assumir o prejuízo, há quem
decida por levar a cobrança às últimas consequências e entrar com uma ação.
"Em casos de avaria, o que conta é ter prova. Se não tem,
nem tente, você vai perder a ação", disse o advogado. Segundo ele, porém,
conseguir as vidências está cada vez mais fácil, com ajuda de testemunhas e dos
sistemas internos de câmeras.
Ausência de vagas especiais ou proibição à entrada de carro
de terceiros são outros casos que também já chegaram aos tribunais e nos quais,
geralmente, os prejudicados conseguem ganhar.
São, em sua maioria, requeridos por pessoas que têm algum
tipo de restrição. Em um caso de 2015, por exemplo, um morador com restrições de
locomoção por conta de um AVC conseguiu em juízo o direito de ter uma vaga
construída pelo condomínio em local de fácil acesso à entrada de sua casa.
Em outro, de 2014, uma família com um filho de três anos
conquistou a permissão para que um motorista entrasse nas dependências do
prédio para buscar e devolver a criança, mesmo sendo proibida a entrada de
veículo de terceiros.
Criança
Barulho, travessuras e discordâncias sobre normas internas
(como se os pequenos podem ou não usar a piscina desacompanhados) são alguns
dos desentendimentos entre adultos e crianças que vivem em um espaço
compartilhado.
Há casos, porém, em que as crianças podem acabar envolvidas
em problemas bem mais sérios, como acidentes ou ofensas graves, e os pais ou
responsáveis podem vir a ser chamados a responder pelas consequências, quando
não pagar.
Em um caso que aconteceu em São Paulo, por exemplo, os pais
foram obrigados a pagar danos morais por seu filho pequeno ter insultado um
funcionário.
Por outro lado, em um incidente no Rio Grande do Sul, foi a
falta de provas que livrou um morador de ter que indenizar as queimaduras de um
menino de seu condomínio. O garoto sofreu queimaduras graves após jogar uma
garrafa de álcool dentro da churrasqueira recém-utilizada, ainda em brasas, e a
garrafa explodiu.
Os pais do menino culparam o vizinho pelo acidente por ter
sido negligente com os objetos usados em seu churrasco, mas, para o juiz do
caso, os acusadores não foram capazes de comprovar a relação entre os fatos.
Fonte: Juliana Elias, UOL
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