De todas as questões que enfrento, talvez a mais delicada
seja a revisão de juros abusivos, especialmente a revisão de juros em
financiamento de imóvel, isto porque para esta atividade existem regras
próprias e específicas. Por exemplo, diante de um financiamento de imóvel junto
às instituições financeiras, é comum, ao fim do financiamento, depois de 360
meses, a pessoa que tomou o empréstimo pagar o valor referente a 3 vezes o
valor do imóvel adquirido.
Tomar de empréstimo o valor de 387 mil reais para a compra
de um imóvel e pagar ao final o valor de 652 mil de juros não parece ser muito
justo, mas estes são valores reais que enfrento em um processo real de revisão
de juros bancários para financiamento da casa própria. Neste caso, aplicando o
sistema de juros compostos, o autor pagará a quantia de R$652.429,44 de juros
ao longo do financiamento, mas aplicando o sistema de juros simples, que são os
devidos no âmbito do SFH, segundo o CDC e a melhor doutrina, o autor deveria
pagar apenas o valor de R$372.205,95 de juros, equivalendo a uma economia de
R$257.223,49.
Toda a questão gira em torno da cobrança de juros compostos
no âmbito do sistema financeiro habitacional; é licito ou não a cobrança de
juros compostos para a compra da casa própria, é lícito a incidência de juros
compostos para a compra de sua moradia, é lícito os bancos serem remunerados
com juros compostos em desfavor do cidadão que compra a sua moradia própria? A
moradia é um direito social ou não, e o governo deve fomentar a aquisição deste
direito social por meio de financiamento remunerado com juros compostos ou
juros simples?
Neste caso real, fui vencido, tendo o i. Juiz Federal
determinado a incidência de juros compostos para a remuneração do capital
tomado emprestado para a compra da casa própria, embora caiba recurso. Para o
magistrado, no âmbito do sistema financeiro habitacional, não incide a Súmula
nº 121 do STF, a qual dispõe sobre a prática de anatocismo, in verbis: “É
vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada".
Para o magistrado, esta Súmula foi editada em 1963, com base no art. 4º do
Decreto nº 22.626/1933 (Lei de Usura), sendo muito antiga, embora ainda não
cancelada.
Mas o contrato de financiamento do imóvel entabulado, a meu
ver, afronta o disposto nos arts. 173, § 4º, inc. III, da Constituição Federal;
art. 4º, inc. III do CDC e art. 4º da Lei 1.521/1951, máxime, citando-se a
violação do princípio da boa-fé, moralidade, lealdade e dever de informação, este
último salutar ao Código de Defesa do Consumidor, a cujo teor identifica-se que
o contrato o infringe, quanto aos arts. 39, IV, V, X, XI; 46; 51, IV, VIII; X,
XIII, § 1º, I, II e III; 52; 54 e 66.
O cálculo financeiro que disponibiliza o conhecimento da
totalidade dos juros que encabeçam o financiamento era incompreensível ao
homem-médio, que sem o devido auxílio técnico, tem sua cognoscibilidade
comprometida, noutras palavras, o real valor do financiamento fora mascarado
pelo contrato, sob nítida violação máxime dos arts. 46 e 52 do Código de Defesa
do Consumidor.
É contrato de adesão, onde o autor não teve condições de
discutir as cláusulas contratuais, presumindo-se então que não houve pactuação
quanto à capitalização de juros, e daí, nestas condições reais, eis que o
contrato de financiamento padece de nulidade.
Mas nada disso foi considerado aos olhos do nobre
magistrado, aliás o magistrado não levou em consideração a questão do direito
social de moradia, e nem as normas do Código de Defesa do Consumidor; para o
julgador importou apenas o art. 15-A da Lei nº 4.380/64, permitindo
expressamente “a pactuação de capitalização de juros com periodicidade mensal
nas operações realizadas pelas entidades integrantes do Sistema Financeiro da
Habitação – SFH”.
O art. 15-A da lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964,
incluído pela Lei nº 11.977/09, permite a pactuação de capitalização de juros
com periodicidade mensal nas operações realizadas pelas entidades integrantes
do Sistema Financeiro da Habitação – SFH, e é o que bastou para o nobre
magistrado negar a revisão e adequação das taxas de juros constantes do
contrato de financiamento da casa própria.
Da decisão do nobre magistrado cabe recurso, sendo que este
advogado não foge ao bom combate, e estaremos aguardando a decisão das
instâncias superiores.
Por fim, algo que ficou bem claro, segundo a sentença do
nobre magistrado, é que os juros compostos não incidem em contratos de
financiamento de imóvel celebrados antes de 7 de julho de 2009, pois esta forma
de capitalização somente foi permitida pela lei 11.977/09 e a partir de sua
vigência, estando ai uma ótima oportunidade para revisão de contratos mais
antigos de financiamento de imóveis.
Autor / Fonte: Rodrigo Silva Froes, advogado. Expert em
Direito Imobiliário, atua na Advocacia Cível e Criminal há mais de 13 anos.
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