Imagine-se que o proprietário de um imóvel venha a falecer
e, dentre todos os herdeiros, irmãos, um deles continue a residir no imóvel de
maneira exclusiva. Com o passar do tempo, sem que os herdeiros deem início ao
inventário para partilhar o imóvel, este herdeiro que exerce a posse exclusiva
sobre o bem ajuíza ação de usucapião para adquirir sua propriedade exclusiva.
Diante disso, a pergunta que se faz é: um dos herdeiros pode
usucapir o imóvel objeto da herança? Em outras palavras, caso o herdeiro resida
no imóvel como se dele fosse, é possível que ele adquira a propriedade deste
imóvel, ainda que seja fruto de herança?
Para responder esta questão é preciso que antes fique claro
do que se trata a usucapião. Quando alguém se mantém na posse de um imóvel por
determinado tempo, observados alguns requisitos da lei, é possível que este
possuidor adquira para si a propriedade do bem imóvel.
Para tanto, é preciso que a posse seja com ânimo de dono, de
forma contínua, mansa e pacífica. Trocando em miúdos, o possuidor deve estar no
imóvel como se dono fosse. A posse deve ser contínua e pacífica. Ou seja, no
curso do prazo da posse não podem existir ações contra o possuidor questionando
a posse, pois isso descaracterizaria a posse mansa e pacífica.
A lei traz diversas espécies de usucapião, cada qual com seu
requisito e tempo específicos. Em que pese a riqueza de detalhes e o prazer do
estudo, não nos cabe neste artigo discorrer sobre as espécies de usucapião
trazidas pela legislação. Pretende-se, tão-somente, responder à questão
colocada no título deste artigo.
E para tanto leva-se em conta recente julgado do Superior
Tribunal de Justiça, no Recurso Especial nº 1.631.859/SP, em que após o
falecimento do proprietário de um imóvel um dos irmãos pleiteou a usucapião
sobre o imóvel objeto da herança.
No julgado, entendeu-se que é possível que um dos herdeiros
pleiteie a usucapião sobre o imóvel,
“desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que
comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião, bem como tenha sido
exercida posse exclusiva com efetivo animus domini pelo prazo determinado em
lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários”.
Completa a decisão que
“sob esta ótica, tem-se, assim, que é possível à recorrente
pleitear a declaração de prescrição aquisitiva em desfavor de seu irmão – o
outro herdeiro/condômino -, desde que, obviamente, observados os requisitos
para a configuração da usucapião (...)”.
Portanto, em resposta ao questionamento inicial, ainda que o
imóvel seja objeto de herança, se um dos herdeiros exercer a posse exclusiva,
preenchidos os requisitos da lei, é possível que ele adquira para si a
propriedade do bem.
Muitas vezes, questões de herança e partilha de bens podem
ser resolvidas rapidamente entre as partes. É possível até que a solução seja
extrajudicial, diga-se, no cartório.
Diante disso, recomenda-se que o interessado regularize sua
situação o quanto antes, o que fará com que o herdeiro elimine uma grande
preocupação de sua vida.
Caso não seja possível abrir o inventário, enquanto a
questão da herança não for solucionada, recomenda-se que os herdeiros aluguem o
imóvel ou firmem um empréstimo (comodato), fato que certamente evitará futuras
discussões acerca da propriedade.
Fellipe Duarte, Advogado Especialista em Direito Imobiliário
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