Em tempos de aperto financeiro, a
locação é interessante, seja para fins comerciais ou residenciais. Porém,
muitos futuros inquilinos, se complicam quando a imobiliária ou o proprietário
do imóvel pedem como garantia, um fiador.
A legislação permite a exigência
em contrato de locação de garantias como: caução, fiança, seguro fiança, ou
cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento (Art. 37, Lei de
Locações).
Art. 37. No contrato de locação,
pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:
I - caução;
II - fiança;
III - seguro de fiança locatícia.
IV - cessão fiduciária de quotas
de fundo de investimento.
Parágrafo único. É vedada, sob
pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de
locação.
Fora isso, o proprietário apenas
pode exigir 1 (um) tipo de garantia, sob pena de nulidade do contrato de
locação. Por assim ser, é frequente que se peça a garantia via fiador, por ser
a forma mais simples. E é justamente neste ponto que ocorrem os problemas.
O futuro inquilino de um imóvel
comercial, por exemplo, não quer perder a locação apenas pelo fato de não ter
um fiador, então opta por formalizar o contrato pela sua empresa individual, e
prestar fiança pelo seu CPF, como pessoa física, sob seus bens pessoais.
É aí que reside o embate, tanto
para o locatário como locador. Antes de tudo, seguimos com o conceito
apresentado pelo Código Civil:
Art. 818. Pelo contrato de
fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo
devedor, caso este não a cumpra.
Da análise do dispositivo legal,
já se pode perceber que o intuito da legislação foi de trazer 3 (três) pessoas
na relação: o devedor (aquele que deve), o credor (aquele que tem algo para
receber) e o fiador (aquele que garante a dívida caso o devedor não pague).
Entretanto, quando o devedor
assume também a figura do fiador, a relação fica desequilibrada, e
eventualmente, permeada por nulidades. Até porque, nos termos do art. 39 da Lei
de Locações, a obrigação do fiador se estende até a devolução efetiva do
imóvel, mesmo quando prorrogada a locação por tempo indeterminado.
Art. 39. Salvo disposição
contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a
efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo
indeterminado, por força desta Lei.
Vejamos um julgado do Superior
Tribunal de Justiça sobre o tema:
DIREITO CIVIL. LOCAÇÃO COMERCIAL.
FIANÇA RECÍPROCA. MAIS DE UM LOCATÁRIO. VALIDADE DA GARANTIA. 1. “A fiança é um
contrato acessório que pressupõe, para sua existência, três pessoas: o credor,
o devedor afiançado e o fiador (AgRg no Ag 1.158.649/RJ, 5.ª Turma, Rel. Min.
ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe de 29/03/2010). [...]
E, na linha do mencionado comando
normativo, este Superior Tribunal de Justiça firmou o posicionamento de que a
fiança de si mesmo não é um contrato juridicamente possível, pois esta espécie
de avença pressupõe a existência de três partes, pois sua lógica é a garantia
de um terceiro. 2. Havendo mais de um locatário, é válida a fiança prestada por
um deles em relação aos demais” (idem). Nesse caso, tem-se uma fiança recíproca,
o que afasta a invalidade do contrato. [...]
Recurso Especial nº 911.993 - DF
(2006/0279066-1) / Relatora: Ministra Laurita Vaz
No caso, a ministra Laurita Vaz
entendeu pela legalidade da fiança prestada por um inquilino em relação aos
demais, pelo fato de haver mais de um locatário – a chamada “fiança recíproca”.
Se diversamente fosse, seria um contrato juridicamente impossível, visto que
toda a lógica da fiança, é ter a garantia de uma terceira parte que não está
diretamente envolvida no negócio.
Assim, podemos observar reflexos
nas relações empresariais, singularmente, no empresário individual (EIRELI), na
forma da Lei 12.441/2011, que assume sob sua firma individual, fiança em
contrato de locação. O TJ-SC já analisou a questão:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO
DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. ENCARGOS LOCATÍCIOS. LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. EXCEÇÃO
DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. NULIDADE DA FIANÇA PRESTADA POR EMPRESÁRIO INDIVIDUAL.
ARTIGO 818 DO CÓDIGO CIVIL. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. O empresário
individual, ou titular de firma individual, não pode prestar fiança para a
empresa por ele mantida, visto a impossibilidade de se transformar uma firma
individual em pessoa jurídica.
(TJ-SC – AI: 566227 SC
2008.056622-7, Relator: Fernando Carioni, Data de Julgamento: 23/05/2011,
Terceira Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Agravo de Instrumento, de
Joinville)
Isto é, o empreendedor individual
não pode ser fiador de si mesmo, pois seu patrimônio pessoal está diretamente
ligado ao da empresa, mesmo que esta possua um CNPJ e capital social
integralizado.
Diferentemente ocorre nas outras
modalidades empresariais, aquelas compostas por 2 sócios. Nestes casos, é
possível em contratos de locação, que a empresa seja a locatária, e apresente
como fiador um dos sócios, na qualidade de pessoa física, respondendo com seus
bens pessoais.
Em suma, não se recomenda que o
proprietário do imóvel/imobiliária aceitem fiança prestada por empresário
individual, quando este for o inquilino. Ou ainda, quando requerida a locação
por pessoa física, que apresente a si mesmo como fiador, justamente pelas
futuras nulidades que poderão advir quando o credor se puser a cobrar
judicialmente os débitos do imóvel.
Fonte: Suzanna Borges de Macedo Zubko, Advogada.