No dia 28 de agosto de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é possível a usucapião de apartamento, através do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 305416, com repercussão geral.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS) havia confirmado uma decisão de primeiro grau que dizia que esse pedido não poderia ser sequer analisado, porque a usucapião apenas caberia no caso de lotes, e não em unidades de um edifício.
Não tendo ficado contente com essa decisão, a moradora recorreu ao STF.
Entendimento do Supremo
No julgamento realizado no dia 28/08, a Corte entendeu que tanto a Constituição Federal (art. 183), Código Civil (art. 1.240) e o Estatuto da Cidade (Lei de nº 10.257/2001)– dispositivos que tratam de usucapião – não fazem distinção se o imóvel que se busca adquirir por meio da usucapião é um apartamento ou não.
Não existe diferenciação entre os possíveis imóveis, pelo texto constitucional e legal. Basta que seja área urbana de até 250m², utilizada para moradia individual ou da família, usado há pelo menos 5 (cinco) anos e que o requerente não tenha outro imóvel (urbano ou rural), nem tenha sido beneficiado pela usucapião anteriormente.
É perfeitamente possível, em um condomínio horizontal (apartamentos), individualizar a área que será usucapida (área privativa) dos demais imóveis que compõem aquele edifício e da área comum.
Desse modo, como o TJRS sequer havia analisado o pedido de usucapião, decidindo por extinguir o processo sem dar essa resposta, a Suprema Corte determinou que o Tribunal julgue o processo da moradora.
Pontos interessantes do julgamento
Prazo para julgamento do recurso
Alguns detalhes desse julgamento merecem ser analisados especificamente.
O primeiro deles é o prazo que o STF levou para julgar esse recurso, nada mais nada menos que 14 (quatorze) anos.
O recurso extraordinário chegou ao Supremo em 2006, tendo sido julgado apenas em 2020. Uma demora inacreditável!
Não foi concedida imediatamente a aquisição da propriedade do imóvel para a moradora
Como o TJRS sequer havia decidido se a moradora teria direito ou não à usucapião, entendendo que esse pedido não poderia ser analisado, por supostamente se tratar de um pedido juridicamente impossível, o STF apenas afirmou que esse pedido não é impossível, pelo contrário, pode ser realizado.
Isso não significa, entretanto, que a moradora tenha, de imediato, o direito à usucapião. O TJRS irá analisar se todos os requisitos autorizadores desta medida estão presentes ou não.
Após essa análise é que o Tribunal irá dizer se concede ou não esse pedido. Algo que inclusive pode ser negado, caso a moradora não tenha cumprido as exigências legais.
Repercussão Geral
A repercussão geral é uma ferramenta que o STF tem para analisar um recurso, de acordo com alguns critérios, e faz com que a decisão do recurso julgado seja aplicada nos demais casos idênticos, pelas instâncias inferiores.
Dessa forma, essa decisão traz um importante precedente.
Usucapião de imóvel com hipoteca ou alienação fiduciária
Uma questão interessante desse caso é que o imóvel objeto do recurso é, aparentemente, gravado por hipoteca ou alienação fiduciária, que são duas espécies de garantias de pagamento.
Apesar de o STF não ter se manifestado expressamente se a usucapião seria possível sobre bens com essas garantias, visto que esse não era o objeto do julgamento, será interessante acompanhar o julgamento do TJRS.
Principalmente porque a moradora do imóvel é ex-cônjuge de quem fez o financiamento do imóvel e não um terceiro. Ao meu ver, a sua posse é precária, algo que inviabiliza a usucapião.
De todo modo, nesse processo ainda tem muita coisa para acontecer e poderá servir para esclarecer outras questões jurídicas, além da possibilidade de usucapir apartamento.
Esse texto se refere a essa notícia publicada no site do STF.
Texto: Rafael Rocha Filho, Advogado Especialista em Imóveis, Contratos e Dívidas
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