Há pouco tempo, fui procurado por uma pessoa que estava com um problema muito grande relacionado ao seu contrato de aluguel.
Ele havia alugado uma sala comercial grande, em frente a um
cemitério de Goiânia, para montar uma floricultura.
O negócio nunca foi para frente. Nenhuma flor foi vendida no
prazo da locação, que durou mais de 5 anos.
Diversos problemas ocorreram, entre eles a falta de
pagamento dos alugueis, que gerou processos judiciais de despejo, atritos entre
locador e locatário e outras coisas.
Como ele não iria permanecer mais no imóvel, questionou de
quem seria a reponsabilidade pelas benfeitorias realizadas nesse bem, como a
instalação de uma câmara fria para o acondicionamento das flores em temperatura
adequada – que ele teve de colocar para a sua atividade comercial -, além da
reforma no imóvel, que foi recebido em péssimo estado de conservação.
As obras realizadas ultrapassaram o valor de 500 mil reais.
E ele devia mais de 300 mil de alugueis atrasados.
O bem já havia sido retomado pelo locador, mas ele não
queria amargar o prejuízo das obras realizadas.
Pois bem. Para dizer se a pessoa tem direito ou não a um
ressarcimento pelas obras realizadas, precisamos analisar algumas coisas, como
a natureza da obra feita e o que diz o contrato.
Primeiro, é necessário verificar a natureza dessa obra. Ela
pode ser uma benfeitoria ou uma acessão.
Benfeitorias
As benfeitorias são bens acessórios incluídos em um móvel ou
imóvel, visando a sua conservação ou melhora da sua utilidade, e pode ser
dividida em:
Benfeitorias necessárias – São as que têm por fim conservar
ou evitar que o bem se deteriore. Exemplo: a reforma do telhado de uma casa.
Benfeitorias úteis – São as que aumentam ou facilitam o uso
da coisa, tornando-a mais útil. Exemplo: instalação de uma grade na janela de
uma casa.
Benfeitorias voluptuárias – São as de mero deleite, de luxo,
que não facilitam a utilidade da coisa, mas apenas tornam mais agradável o uso
da coisa. Exemplo: construção de uma piscina em uma casa.
Acessões
As acessões são obra nova que se ajuntam as existentes. São
incorporações introduzidas em um outro bem, imóvel, por quem de direito. Por
exemplo: construção de um galpão em um terreno vazio.
A Lei do Inquilinato, em seu art. 35 e 36, afirma que o
locatário (inquilino) tem direito a receber pelas benfeitorias úteis, desde que
autorizadas e às necessárias, mesmo que não tenham sido autorizadas pelo
contrato, podendo levantar (retirar) as voluptuárias que não causem prejuízo ao
imóvel.
E é possível que o locatário, sobre as benfeitorias que tem
direito, exerça o direito de retenção, que é a possibilidade de conservar em
seu poder a coisa ou de recusar-se a restituí-la até que seja satisfeita a obrigação.
Em relação às acessões, sendo realizadas de boa-fé, o
locatário, nos termos do art. 1.255, do Código Civil, fará jus à indenização,
porém, não tem direito de retenção, por se tratar de direito diverso daquele
previsto no art. 35, da Lei do Inquilinato.
As possibilidades acima serão aplicadas quando não houver
nenhuma disposição contratual em sentido contrário, porque essa questão pode
receber um regramento diferente, a depender do que for estabelecido entre as
partes.
Por isso falei, anteriormente, que a análise de uma situação
como essa dependia da natureza da obra realizada e, também, o que reza o
contrato.
É que o art. 35, da Lei de nº 8.245/1991, permite que, por
disposição contratual expressa, as benfeitorias de qualquer espécie não sejam
indenizadas.
É neste sentido a Súmula 15 do extinto 2º TAC: “É
dispensável prova sobre benfeitorias se há cláusula contratual em que o
locatário renunciou ao respectivo direito de retenção ou de indenização”.
Sobre o tema referente à indenização de benfeitoria no
imóvel locado, o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento por
meio da Súmula 356: “Nos contratos de locação é válida a cláusula de renúncia à
indenização das benfeitorias e ao direito de retenção”.
E, de igual modo, também é permitido que haja a renúncia ao
direito de recebimento de indenização/ressarcimento pelas acessões, veja:
Ainda que a construção de prédio em terreno locado possa ser
tecnicamente considerada acessão, e não benfeitoria, válida é a cláusula
contratual que exclui o respectivo direito de indenização, porque cuida-se, em
última análise, de estipulação envolvendo direito disponível. E, porque não
vedada pela lei, insere-se no âmbito daquelas matérias albergadas pelo
princípio da chamada autonomia de vontade.
2º TACivSP – Ap s/rev. 495 975 – Sexta Câmara – Rel. Paulo
Hungria – J. 30/9/1997.
No caso que mencionei no começo do texto, todas as
benfeitorias ou acessões não seriam ressarcidas pelo locador e seriam incorporadas
no imóvel, de acordo com as disposições do contrato de locação firmado.
E por se tratar de direito disponível, firmado por agentes capazes, mediante contrato civil, não é possível alegar abusividade dessa cláusula ou aplicação dos direitos previstos no Código de Defesa do Consumidor.
É preciso tomar muito cuidado com o que diz o contrato.
Pedir auxílio profissional para analisá-lo e te informar dos riscos que ele
pode trazer, caso contrário, você poderá amargar um prejuízo grande, como 500
mil reais, na situação que mencionei.
Texto: Rafael Rocha Filho é advogado, especialista em
Imóveis, Contratos e Dívidas, com atuação em demandas de pessoas e empresas em
Empréstimos Bancários, Financiamentos Imobiliários, Processos de Execução,
Execução Fiscal, Revisionais de Contratos, Ações de Indenização, Busca e
Apreensão de Veículos e Leilões de Imóveis.