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quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

O que é um financiamento de imóvel? Como funciona a alienação fiduciária imobiliária?

O ordenamento jurídico brasileiro somente em 1997 passou a permitir, o financiamento imobiliário. 

Até a promulgação da Lei nº 9.514 de 1997, os bens suscetíveis de alienação fiduciária eram apenas os bens móveis. A lei contudo, é mais abrangente. Além, de prever uma sistematização para a Alienação Fiduciária Imobiliária, ela visa a facilitar a construção de unidades imobiliárias, prevê vários direitos reais de garantia para lastrear as operações de construção de unidades imobiliárias e o incremento da negociação de títulos de securitização no mercado financeiro brasileiro.

As operações de construção de novas unidades imobiliárias poderão ter como garantia:

1. Hipoteca do próprio bem;

2. Cessão fiduciária de direitos creditórios decorrentes de contratos de alienação de imóveis;

3. Caução de direitos creditórios ou aquisitivos decorrentes de contratos de venda ou promessa de venda de imóveis;

4. Alienação Fiduciária de coisa imóvel (art. 17 da Lei n. 9.514/1997).

A princípio, o intuito do legislador foi permitir a atuação apenas de instituições que tivessem caráter estritamente financeiro ou de concessão de crédito- neste último caso, ainda que não fossem necessariamente caracterizadas como instituições financeiras. Foram autorizadas, inicialmente, a celebrar este tipo de contrato a Caixa Econômica Federal, os bancos comerciais, os bancos de investimentos, os bancos com carteiras de crédito imobiliário, as sociedades de crédito imobiliário, as associações de poupança e empréstimos e as companhias hipotecárias.

As operações de Alienação Fiduciária Imobiliária foram identificadas como um dos aspectos de normatividade mais abrangente que o legislador nomeou como Sistema Financeiro Imobiliário. Não foram previstas apenas regras contratuais do modus operandi do novo tipo. Há previsão de normas financeiras e tributárias.

Como na alienação fiduciária tout court que conhecemos, o devedor fiduciante recebe a pecúnia do credor para aquisição do bem e, em troca, lhe transfere a propriedade e a posse indireta com a função de garantia, permanecendo ele, devedor, com a posse direta do bem. Ao credor, se atribui uma propriedade plena, seu direito está sujeito a condição resolutiva com escopo de garantia.

É ato indispensável ao seu aperfeiçoamento o registro imobiliário da alienação fiduciária.

Além do direito à propriedade, podem ser objetos da Alienação Fiduciária Imobiliária:

· Bens enfitêuticos;

· Direito de uso especial para fins de moradia;

· Direito real de uso, desde que suscetível de alienação;

· Propriedade superficiário.

O contrato deve conter necessariamente:

1) O valor do principal da dívida;

2) Prazo e as condições de reposição do empréstimo ou crédito do fiduciário;

3) A taxa de juros e os encargos incidentes;

4) A Cláusula de constituição da propriedade fiduciária, com descrição do imóvel objeto da alienação fiduciária e a indicação do titulo e modo de aquisição;

5) A cláusula assegurando ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre utilização, por sua conta e risco do imóvel objeto da alienação fiduciária;

6) A indicação, para efeito de venda em público leilão, do valor do imóvel e dos critérios para a respectiva revisão;

7) A cláusula dispondo sobre os procedimentos de alienação do bem fiduciário em leilão (art. 24 da Lei n. 9.514/97).

Deixou de pagar o financiamento, e agora?
Vencida e não paga a dívida, inaugura-se o procedimento previsto no artigo 26 da Lei, no qual todo o procedimento pode se dar extrajudicialmente, com a interferência dos notários do Registro Imobiliário e do Registro de Títulos e Documentos.

Após a intimação do alienante fiduciante, este terá o prazo de quinze dias para purgar a mora. O montante a ser pago para a purgação da mora constitui-se da prestação vencida e as que venceram até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e da intimação. O fiduciante tem direito à purga da mora apenas uma única vez.

Purgada a mora (saldada a dívida), o oficial do Registro Imobiliário deve entregar ao agente fiduciário todas as quantias recebidas, autorizada a retenção das despesas de cobrança e intimação. Caso torna-se adimplente, pode ocorrer que o fiduciante deseje ou não possa suportar todos os ônus do contrato celebrado, assim, desde que haja concordância do credor fiduciário, ele poderá ceder o seu direito. O cessionário deverá acertar eventuais débitos com o credor e providenciará a averbação da transação no registro imobiliário. O alienante fiduciante poderá, inclusive, resolver o contrato de alienação fiduciária oferecendo o seu bem em pagamento ao próprio credor fiduciário.

Não purgada a mora, configura-se o inadimplemento absoluto, implementa-se a condição resolutiva, e se consolida a propriedade em nome do fiduciário. Impõe-se, todavia, importante restrição ao seu direito de propriedade: o imóvel deve ser levado a público leilão, no prazo de trinta (30) dias, a contar da averbação na matrícula do imóvel no RGI da consolidação da propriedade, seguindo-se os trâmites previstos no artigo 27 da supra citada Lei.

A Lei n. 9.514/97 é mais abrangente do que a mera previsão da alienação fiduciária imobiliária. Como mecanismo de inventivo, foram criados os Certificados de Recebíveis Imobiliários – CRI. Constituem, em verdades, títulos de crédito nominativos, de livre negociação, lastrados em créditos imobiliários e encerram promessa de pagamento em dinheiro.

Esses certificados só podem ser emitidos pelas companhias securitizadoras das construções dos imóveis, mas são administrados por instituições financeiras (art. 9º da Lei 9.514/97).

Art. 9º A companhia securitizadora poderá instituir regime fiduciário sobre créditos imobiliários, a fim de lastrear a emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários, sendo agente fiduciário uma instituição financeira ou companhia autorizada para esse fim pelo BACEN e beneficiários os adquirentes dos títulos lastreados nos recebíveis objeto desse regime.

Eles se prestam a ser adquiridos pelo mercado financeiro ou público em geral, na medida em que preveem uma taxa de retorno expressamente discriminada. Torna-se, factualmente, mais uma modalidade de investimento para o interessado, cuja a transparência pode ser identificada no detalhamento que a Lei discrimina: o CRI deve possuir a identificação do devedor e o valor nominal de cada crédito que lastreie a emissão, com a individuação do imóvel a que esteja vinculado e a indicação do Cartório de Registro de Imóveis em que esteja registrado e a respectiva matrícula, bem como a indicação do ato pelo qual o crédito foi cedido. Além disso, deve identificar os títulos emitidos e a constituição de outras garantias de resgate dos títulos da série emitida, se for o caso (art. 8º da Lei n. 9.514/97).

Art. 8º A securitização de créditos imobiliários é a operação pela qual tais créditos são expressamente vinculados à emissão de uma série de títulos de crédito, mediante Termo de Securitização de Créditos, lavrado por uma companhia securitizadora, do qual constarão os seguintes elementos:

I - a identificação do devedor e o valor nominal de cada crédito que lastreie a emissão, com a individuação do imóvel a que esteja vinculado e a indicação do Cartório de Registro de Imóveis em que esteja registrado e respectiva matrícula, bem como a indicação do ato pelo qual o crédito foi cedido; (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)

II - a identificação dos títulos emitidos;

III - a constituição de outras garantias de resgate dos títulos da série emitida, se for o caso.

Parágrafo único. Será permitida a securitização de créditos oriundos da alienação de unidades em edificação sob regime de incorporação nos moldes da Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964.

Toda a operação de securitização das construções sob o regime da Lei n. 9.514/97 exige que as companhias seguradoras possuam patrimônio separado, individualizado e garantidor da emissão desses títulos, para a segurança dos próprios adquirentes do CRI, como também dos adquirentes das unidades imobiliária seguradas (art. 11 da Lei n. 9.514/97).

Caso descumpra essas normas, o patrimônio integral da companhia seguradora pode vir a responder por eventuais débitos junto aos adquirentes dos CRIs.

O agente financeiro fiduciário é o responsável pela fiscalização da constituição desse patrimônio individualizado e para correspondência valorativa entre o real valor dos bens garantidores e a emissão dos CRIs.

Mesmo em caso de funcionamento normal da companhia seguradora dos certificados, o agente fiduciário é autorizado a interferir, se necessário, judicialmente, para garantir o patrimônio constituído para lastrear as operações. Caso não o faça, ou o faça de forma temerária, o seu patrimônio próprio pode vir a ser responsabilizado para a garantia de eventuais prejuízos aos adquirentes dos certificados (art. 13, § 1º da Lei n. 9.514/97).

Para o incentivo de operações que envolvam a Alienação Fiduciária Imobiliário, a Lei n. 10.931/04, criou ainda duas outras figuras jurídicas com repercussão financeira:

a. A letra de Crédito Imobiliário, que pode ser emitida por instituições financeiras, cujo regramento se assemelha a uma letra de câmbio, espécie de títulos de créditos de livre circulação;

b. Cédula de Crédito Bancário que representa a emissão de um título para lastrear aplicações financeiras, mas que somente pode ser emitida pelo credor de um crédito imobiliário.

As Cédulas de Crédito Imobiliário emitidas pelo Credor são, usualmente, adquiridas pelas companhias seguradoras que consolidam com essa compra o negócio fiduciário, quando o fiduciante aliena a propriedade que lastreia o títulos (CCIs) para a companhia seguradora, como agente fiduciário, e este fica autorizado a emitir as CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários).

Retornando à operação originária da Alienação Fiduciária Imobiliária (Lei n. 9.514/97), embora a legislação preveja certa liberdade no ato de contratar, há regras impositivas que as partes devem respeitar. Entre elas estão o devedor deve repor integralmente o valor recebível, com os reajustes; as taxas cobradas pelo credor ao devedor serão as taxas discriminadas em contrato; pode haver capitalização dos juros cobrados e a obrigatoriedade de contratação, pelo devedor, de seguros contra os riscos de morte e invalidez permanente.

Com relação às taxas previstas contratualmente, está ínsita a liberdade de contratar. Pode o credor cobrar taxas maiores do que a do mercado financeiro remuneraria a quantia em que está sendo emprestada. Contudo, a seara contratual está envolta em uma sistematização vinculante, em que os princípios gerais do direito, os costumes e a boa-fé têm pronunciada influência sobre as contratações.

Não pode o credor prever em contrato taxas discrepantes do mercado.
Não pode o credor prever em contrato taxas que discrepem muito do ramo de atividade em que se aplica o dinheiro, ou seja, ainda que haja liberdade de contratar, as taxas de juros e o índice de correção monetária eleito devem se coadunar com o mercado a que se destina. Pode haver a previsão de juros remuneratório, pela quantia emprestada; juros moratórios, em caso de inadimplência; e a previsão de juros compensatórios, no caso da entrega antecipada do bem.

São espécie diferentes de juros aplicados a hipóteses diversas de atos contratuais. O mais comum deles são os juros remuneratórios. Juros que buscam recompor o capital que o credor emprestou ao devedor para a realização do negócio. Esses juros devem respeitar o limite legal, a aplicação do artigo 406 do Código Civil, que prevê o limite para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. Embora a espécie se refira a juros moratórios, aplica-se à modalidade de juros remuneratórios do capital.

Embora a Lei permita a capitalização, sem discriminar a periocidade que ela se dê, aplica-se subsidiariamente o Código Civil, que prevê em seu artigo 591 do Código Civil, a capitalização anual dos juros, qualquer que seja a sua espécie.

Art. 591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual.
Interessante mecanismo de proteção ao adquirente da unidade imobiliária foi a previsão da constituição do seguro contra o inadimplemento do construtor ou do incorporador que tenham assumido a construção de unidades sob o regime da Lei n. 4.591, de 16 de dezembro de 1964. Esse seguro, se contratado, pelo adquirente, deve prever o ressarcimento integral das quantias pagas por ele, permitindo-se a dedução dos valores pagos a título de administração do financiamento e administração do seguro.

Fonte: Raphael Faria, Advogado Especialista em Direito Civil e Processo Civil. Especialista em Direito Bancário

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