Um dos grandes debates, na esfera do direito
condominial, é sobre o direito de Constitucional de possuir um animal
doméstico, em sua unidade habitacional, em detrimento de uma eventual proibição
total ou restrição quanto à quantidade de animais, porte, raça ou outra
qualquer característica.
Em entendimento mais recente decidiu o
Tribunal de Justiça de Goiás, que quando há conflito entre dois direitos, o que
deve prevalecer é o que possui maior peso relativo, desde que não cause
qualquer dano a terceiros. Assim entendeu Tribunal, ao permitir que um morador
de um condomínio pode manter seu animal de estimação no apartamento.
Em decisão monocrática, o desembargador
também anulou a cláusula do regulamento interno do condomínio que proíbe a
permanência de quaisquer espécies de animal. O desembargador destacou que, para
prevalecer a proibição sobre a existência de animais no condomínio, é preciso
comprovar prejuízo à saúde e à segurança dos outros moradores.
“O direito de propriedade do autor de manter
animal doméstico de pequeno porte em sua unidade não pode ser tolhido em razão
de norma prevista em convenção de condomínio, quando o exercício de tal direito
não causa nenhuma perturbação, desconforto ou risco aos demais condôminos, sob
pena de implicar restrições ao uso da sua propriedade", registrou na
decisão.
O direito do morador de manter seu bicho em
seu apartamento já havia sido confirmado em primeiro grau pela 3ª Vara Cível da
comarca de Rio Verde. O condomínio alegava na ação que a permanência de animais
no edifício foi proibida pela maioria dos moradores em votação durante
assembleia deveria prevalecer. Também argumentou que não é relevante para o
debate o potencial ofensivo do animal, conforme citou o dono do bicho.
De acordo com o juiz, apesar de a regra que
rege a relação entre os moradores ser resultado da vontade da maioria, essa
limitação não pode ser verdade absoluta. “O juiz a quo entendeu que a proibição
genérica da presença de animais em condomínios tem sido flexibilizada pela
jurisprudência, principalmente quando se trata de animal de estimação e que não
seja nocivo nem afete a tranquilidade dos demais condôminos.”
O juiz citou ainda que quando há esse tipo de
conflito, deve prevalecer o direito de maior peso relativo, desde que não haja
qualquer danos a terceiros. “Não se evidenciam motivos suficientes para proibir
a permanência do animal no condomínio, pois não se está diante de uso anormal
da propriedade, conforme previsto no artigo 1.277, do Código Civil de 2002”,
finalizou o desembargador.
Outro entendimento, é que a proibição poderia
até restringir animais no condomínio, se esta fosse a vontade da maioria, e
estivesse disposta esta proibição na convenção de condomínio. Entretanto não
poderia, de forma genérica, discriminar o número de animais por unidade, porte
ou raça, pois seria discriminatório e superaria o poder de legislar do
condomínio e de sua assembleia votante. Mesmo assim, este entendimento, de
proibição total de animais em condomínios não é unânime, e tem causado grande
polêmica como veremos a seguir.
Vejamos primeiramente as obrigações do
condomínio e os deveres do síndico de acordo com a legislação;
Ao condomínio, resta a obrigação de se
estabelecer o contraditório. Através do síndico, que o responsável civil e
criminalmente pelos atos administrativos condominiais e de sua gestão, é
obrigado a estabelecer diálogo com o morador. Cumpre lembrar, que de acordo com
o art. 1348 do Código Civil, o administrador condominial é obrigado à; I - convocar
a assembleia dos condôminos; I - convocar a assembleia dos condôminos;II -
representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora
dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns;III - dar imediato
conhecimento à assembleia da existência de procedimento judicial ou
administrativo, de interesse do condomínio;IV - cumprir e fazer cumprir a
convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia;V - diligenciar
a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços
que interessem aos possuidores.
Dentre as principais obrigações descritas; o
dever de notificar o condômino que descumpre as regras, convocar assembleia
para discutir a questão e estabelecer o diálogo entre as partes.
Cumpre lembrar ainda, que após a notificação,
o condômino contestante, tem direito e prazo para uma exercer sua defesa. Deve
ser verificado também, se houve agendamento de reunião de condomínio para
discutir o assunto de animais, porque mesmo que exista previsão na convenção, a
norma afronta um direito Constitucional legítimo.
O bom senso é essencial nas relações
condominiais, e deve prevalecer também na confecção das normas e estatutos
internos, para que estes não confrontem diretamente com o Código Civil e
Constituição Federal, que são normas superiores em grau de importância e
hierarquia aos estatutos internos, tais como convenções, portarias e
regimentos.
O entendimento consolidado é que, o condômino
tem direito de possuir animais em sua unidade habitacional, mas o barulho
causado por estes animais, pode se tornar um entrave para o respeito e
cumprimento à Lei do Silêncio e o horário de descanso entre 22:00hs à 06:00hs,
no caso de Minas Gerais, a Lei 7.302/78 trata do tema. Se o barulho for
excessivo, o morador deverá receber, notificações, multas, podendo chegar até
atitude extrema e efetiva de remoção dos animais.
Em uma decisão recente, a 3ª Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de Santa Catarina concedeu liminar a um casal permitindo
seus bichos de estimação continuem a viver com eles no condomínio onde moram.
Por considerar que os quatro cães e dois gatos são “membros da família”, uma
vez que vivem com ela há muitos anos, e não ameaçam os animais silvestres que
vivem na região.
Os condôminos proibiram, em assembleia geral,
animais domésticos no local. Como o casal se recusou a abrir mão dos cães e
gatos, os vizinhos foram à Justiça. De acordo com eles, presença dos bichos
poderia prejudicar os animais silvestres da região — o imóvel fica em uma área
de preservação permanente.
Em sua defesa, o casal disse que, na época da
aquisição do imóvel, o então síndico permitiu a permanência dos animais com
base em autorização no regimento interno do condomínio, e que seria injusto
obriga-los a se livrar deles agora.
A partir dessa informação, o desembargador
substituto Gilberto Gomes de Oliveira, relator do caso, observou que inexistem
no processo elementos a demonstrar que os animais domésticos colocam em risco a
fauna silvestre ou causam sérios danos à vida dos condôminos.
"Observa-se que o condomínio é amplo e
as residências afastadas umas das outras; pelo bom senso, é presumível o zelo
dos agravados em manter os animais devidamente acautelados no cercado da
residência; aliás, há nos autos registros fotográficos que comprovam a
existência de canil apropriado no imóvel", ponderou o magistrado.
Para o relator, os fatos comprovam que os
animais são mais do que meros" seres moventes ", além de já
integrarem a família durante muitos anos e nutrirem afeição e carinho pelos
seus donos. Assim, o magistrado considerou que o afastamento da residência
seria demasiadamente drástico.
"Outrossim, ainda que haja latidos, eles
devem ser tolerados, pois trata-se de animais (seres irracionais); porém, caso
os ruídos fujam da normalidade esperada, ocasionando perturbação excessiva a
terceiros, serão imperiosas medidas alternativas, desde que comprovada a
situação extrema", ponderou o desembargador. A decisão foi unânime.
Para o Tribunal de Justiça de Goiás, “o
direito de propriedade do autor de manter animal doméstico de pequeno porte em
sua unidade não pode ser tolhido em razão de norma prevista em convenção de
condomínio quando o exercício de tal direito não causa nenhuma perturbação,
desconforto ou risco aos demais condôminos, sob pena de implicar restrições ao
uso da sua propriedade".
Também nesse sentido, a 6ª Vara Cível de
Ribeirão Preto (SP) considerou inválida restrição a cachorros de grande porte,
pois não se pode afirmar que eles afetem os vizinhos mais do que os pequenos e
médios.
Assim, podemos perceber, que não existe um
consenso entre os Tribunais brasileiros, sobre a questão, ou mesmo uma posição
definitiva do STJ. Mesmo assim, existe uma tendência jurisprudencial dos
Tribunais locais, a decidirem pelo respeito ao direito de propriedade
Constitucional e consequentemente, dar prevalência ao entendimento de que mesmo
que na norma condominial exista proibição de animais nas unidades
habitacionais, este pode ser considerado nula ou inválida por que afronta
diretamente a Carta Magna.
A Doutrina e jurisprudência têm permitido, a
depender do caso concreto, que o aplicador da norma possa imprimir leitura
diferenciada, com efeito, a permanência de um animal em um prédio só pode ser
proibida se houver violação do sossego, da salubridade e da segurança dos
condôminos (art. 1.336, IV, Código Civil), invoca-se o clássico paradigma dos
três S, para “uma devida eficiência de análise do caso concreto ao desate
meritório”.
De tal conduta, é certo que o condomínio pode
estabelecer regras limitativas do direito de vizinhança, conforme autoriza a
Lei 4.591/64. Entretanto, a disposição interna do condomínio que proíbe a
criação de animais deve ser avaliada no seu verdadeiro alcance finalístico.
Interpreta-se, pois, que a proibição condominial não se refere a animal de
grande ou médio porte, mas os de grande ou médio porte que violem o sossego, a
salubridade e a segurança dos condôminos.
O fato é que, por mais que tenhamos um
conceito legalista, onde a Lei determina a obrigação de cumpri-la sem
questionamento, e o fato de que o estatuto menor acompanha o disposto nas
cartas civilistas e constitucional, a interpretação de um preceito jurídico
deverá observar antes de tudo, o sentimento da realidade que o determinou, já
que os fatos não se submetem a lógica.
Artigo Jurídico de Bernardo César Coura;
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