Mês passado, durante uma reunião, ouvi do superintendente de um shopping center americano essa frase instigante: “Se o meu lojista não for omnichannel, é sinal de que ele não está em sintonia com o consumidor e, portanto, não terá bom desempenho”. Esse pensamento contraria a ideia que predominava na indústria de shopping centers até pouco tempo atrás, quando o e-commerce era considerado um inimigo a ser combatido. Hoje, esse assunto passou a ser visto com outros olhos.
O que mudou de lá para cá?
Dados do US Census Bureau mostram que em 2017 as lojas virtuais concentraram 8,9% das vendas totais do varejo nos Estados Unidos. É com base neste número que muitos especialistas minimizam a ameaça do e-commerce ao varejo físico, argumentando que mais de 90% das vendas ainda acontecem em lojas de tijolo e cimento. A questão é que se considerarmos todas as vendas influenciadas pelo digital, esse índice sobe para 51,4%. Se pensarmos apenas nas vendas off-line, nada menos do que 38,5% dessas transações em território americano foram digitalmente influenciadas por meio de ações como comparações de preços, consulta a avaliações de clientes e pesquisa de atributos de produto, entre outras coisas, de acordo com a Forrester Research. A conclusão é simples: do ponto de vista do consumidor, o omnichannel é um caminho sem volta.
De que maneira essa constatação afeta os shoppings? O varejo físico tem investido cada vez mais em estratégias como ‘click & collect’ (compra online, busca na loja), o que para os shopping centers pode até significar vantagem: segundo o ICSC (International Council of Shopping Centers), 61% dos clientes que vão retirar produtos em lojas físicas acabam comprando algum item adicional. Numa demonstração de que estão dispostos a rever antigos conceitos, alguns empreendedores americanos começaram até a instalar lockers da Amazon no mall, para que os clientes possam retirar ali produtos comprados na web, de olho no aumento de fluxo que isso pode gerar. Essa, porém, pode ser apenas a ponta de um imenso iceberg.
Aqui no Brasil já tem gente testando novos caminhos. A CCP (Cyrela Commercial Properties) lançou, no final de 2017, seu marketplace para venda online de produtos dos lojistas, com retirada nas lojas físicas localizadas em shoppings da rede. A brMalls, por sua vez, anunciou mês passado uma associação com a Delivery Center para criar em shopping centers uma espécie de central de logística para entrega de produtos vendidos pelo e-commerce dos lojistas. A Multiplan, segundo rumores do mercado, não deve tardar a também surfar a onda da integração dos canais de venda.
No entanto, o omnichannel pode produzir ainda outra valiosa oportunidade para os shopping centers: o desenvolvimento de uma nova geração de lojistas, bem sintonizados com o gosto dos consumidores mais jovens. Durante a RECon, importante evento promovido em maio pelo International Council of Shopping Centers, a Fifth Wall, empresa de Venture Capital, deu uma boa dimensão da quantidade de varejistas online que está cruzando a ponte entre o digital e o físico, para se aproximar dos seus clientes finais. Para entender o que isso representa, basta dizer que, ao final de 2017, nada menos do que 44 marcas nativas digitais já operavam 167 lojas em território americano. Estamos falando de negócios como Bonobos, Warby Parker, Indochino, allbirds, Peloton, Rent the Runway e outras mais – sem falar na Amazon, com suas Amazon Books e Amazon Go. A estimativa é que esse número pule em 5 anos para 281 marcas e 1.120 lojas. Por trás desse importante movimento de renovação está a constatação de que, assim como os varejistas físicos não podem abrir mão da presença digital, as marcas digitais também dependem das lojas de tijolo e cimento para crescer.
Em resumo, é hora dos shopping centers abandonarem a lógica simplista do ‘isso ou aquilo’, porque a divisão entre o mundo físico e o digital não faz mais sentido na cabeça do consumidor. A palavra de ordem é arregaçar as mangas e tratar de combinar o melhor desses dois mundos. Afinal, o inimigo de ontem pode ser um poderoso aliado amanhã.
Fonte: Por Luiz Alberto Marinho, Mercado & Consumo
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