Conforme o REsp 1.699.022-SP, de relatoria do eminente
Ministro Luis Felipe Salomão, que teve seu voto acompanhado por unanimidade na
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, a disposição condominial que
proíbe a utilização das áreas comuns do edifício por condômino inadimplente é
ilícita. (Informativo 651 – 02.08.2019)
Na prática os condomínios utilizam-se de referida norma no regimento interno com a finalidade de coibir o condômino a pagar suas dívidas junto ao condomínio.
Contudo, referida regra acaba por causar não só a limitação do direito de propriedade, mas acaba por constranger a honra da família perante os demais condôminos e até mesmo visitantes do condomínio, ao impedir o acesso às áreas comuns (piscina e academia, por ex.).
A ilicitude reconhecida pelo STJ, diante da análise concreta
do caso, pode gerar pretensão por danos morais, que poderá ser reconhecida com
base na atual jurisprudência.
"Mas por que a regra prevista em regimento interno,
aprovado em Assembleia pela maioria dos condôminos não tem validade?”
É necessário relembrar aqui, dois dos postulados norteadores
da aplicação das normas do Código Civil de 2002, legados a nós por Miguel
Reale, quais sejam: a eticidade e a sociabilidade.
Pela eticidade, deve ser respeitada a boa-fé objetiva nas
relações privadas. E este dever anexo impõe a exigência de que as partes adotem
as posturas mais amenas, ou seja, menos gravosas na obtenção de seus fins.
Quanto à sociabilidade, a proibição de utilização das áreas
comuns em razão de dívidas pode gerar desconforto ao convívio social, que pode
culminar em constrangimentos e abalos à personalidade dos integrantes da
família.
Assim, o contrato interno (regimento), não pode descumprir
os deveres anexos da boa-fé objetiva e da boa convivência social, ainda que se
saiba que é lícito e de grande importância para a manutenção do condomínio que
seus condôminos estejam em dia com sua quota do rateio.
Entretanto, o Código Civil dispõe de outras maneiras para
que seja efetuada a cobrança do condômino, como: aplicação dos juros, multas,
impedimento de votar em determinadas questões em Assembleias e até mesmo estar
sujeito a perder o imóvel para quitar referida dívida.
Leia a íntegra do julgado:
“CONDOMÍNIO. REGULAMENTO INTERNO. PROIBIÇÃO DE USO DE ÁREA
COMUM DESTINADA AO LAZER. CONDÔMINO INADIMPLENTE E SEUS FAMILIARES. IMPOSSIBILIDADE.
SANÇÕES PECUNIÁRIAS TAXATIVAMENTE PREVISTAS NO CÓDIGO CIVIL.
É certo que,
dentre todos os deveres dos condôminos, o que diz respeito ao rateio das
despesas condominiais é, sem dúvida, o de maior relevo, por se relacionar
diretamente com a viabilidade da existência do próprio condomínio. No entanto,
é ilícita a prática de privar o condômino inadimplente do uso de áreas comuns
do edifício, incorrendo em abuso de direito a disposição condominial que
determina a proibição da utilização como medida coercitiva para obrigar o
adimplemento das taxas condominiais. O Código Civil estabeleceu meios legais
específicos e rígidos para se alcançar tal desiderato, sem qualquer forma de
constrangimento à dignidade do condômino inadimplente: a) ficará
automaticamente sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo
previstos, ao de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o
débito (§ 1º, art. 1.336); b) o direito de participação e voto nas decisões
referentes aos interesses condominiais poderá ser restringido (art. 1.335,
III); c) é possível incidir a sanção do art. 1.337, caput, do CC, sendo
obrigado a pagar multa em até o quíntuplo do valor atribuído à contribuição
para as despesas condominiais, conforme a gravidade da falta e a sua reiteração;
d) poderá haver a perda do imóvel, por ser exceção expressa à impenhorabilidade
do bem de família (Lei n. 8.009/1990, art. 3º, IV). E como é sabido, por uma
questão de hermenêutica jurídica, as normas que restringem direitos devem ser
interpretadas restritivamente, não comportando exegese ampliativa.” (STJ REsp
1.699.022-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade,
julgado em 28/05/2019, DJe 01/07/2019)
Fonte / Autor: Rafael J Dias, Advogado - Corporativo, Responsabilidade Civil, Administrativo e Criminal.
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