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terça-feira, 30 de julho de 2019

Revisão de financiamento de imóvel, é possível?

De todas as questões que enfrento, talvez a mais delicada seja a revisão de juros abusivos, especialmente a revisão de juros em financiamento de imóvel, isto porque para esta atividade existem regras próprias e específicas. Por exemplo, diante de um financiamento de imóvel junto às instituições financeiras, é comum, ao fim do financiamento, depois de 360 meses, a pessoa que tomou o empréstimo pagar o valor referente a 3 vezes o valor do imóvel adquirido.

Tomar de empréstimo o valor de 387 mil reais para a compra de um imóvel e pagar ao final o valor de 652 mil de juros não parece ser muito justo, mas estes são valores reais que enfrento em um processo real de revisão de juros bancários para financiamento da casa própria. Neste caso, aplicando o sistema de juros compostos, o autor pagará a quantia de R$652.429,44 de juros ao longo do financiamento, mas aplicando o sistema de juros simples, que são os devidos no âmbito do SFH, segundo o CDC e a melhor doutrina, o autor deveria pagar apenas o valor de R$372.205,95 de juros, equivalendo a uma economia de R$257.223,49.

Toda a questão gira em torno da cobrança de juros compostos no âmbito do sistema financeiro habitacional; é licito ou não a cobrança de juros compostos para a compra da casa própria, é lícito a incidência de juros compostos para a compra de sua moradia, é lícito os bancos serem remunerados com juros compostos em desfavor do cidadão que compra a sua moradia própria? A moradia é um direito social ou não, e o governo deve fomentar a aquisição deste direito social por meio de financiamento remunerado com juros compostos ou juros simples?

Neste caso real, fui vencido, tendo o i. Juiz Federal determinado a incidência de juros compostos para a remuneração do capital tomado emprestado para a compra da casa própria, embora caiba recurso. Para o magistrado, no âmbito do sistema financeiro habitacional, não incide a Súmula nº 121 do STF, a qual dispõe sobre a prática de anatocismo, in verbis: “É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada". Para o magistrado, esta Súmula foi editada em 1963, com base no art. 4º do Decreto nº 22.626/1933 (Lei de Usura), sendo muito antiga, embora ainda não cancelada.

Mas o contrato de financiamento do imóvel entabulado, a meu ver, afronta o disposto nos arts. 173, § 4º, inc. III, da Constituição Federal; art. 4º, inc. III do CDC e art. 4º da Lei 1.521/1951, máxime, citando-se a violação do princípio da boa-fé, moralidade, lealdade e dever de informação, este último salutar ao Código de Defesa do Consumidor, a cujo teor identifica-se que o contrato o infringe, quanto aos arts. 39, IV, V, X, XI; 46; 51, IV, VIII; X, XIII, § 1º, I, II e III; 52; 54 e 66.

O cálculo financeiro que disponibiliza o conhecimento da totalidade dos juros que encabeçam o financiamento era incompreensível ao homem-médio, que sem o devido auxílio técnico, tem sua cognoscibilidade comprometida, noutras palavras, o real valor do financiamento fora mascarado pelo contrato, sob nítida violação máxime dos arts. 46 e 52 do Código de Defesa do Consumidor.

É contrato de adesão, onde o autor não teve condições de discutir as cláusulas contratuais, presumindo-se então que não houve pactuação quanto à capitalização de juros, e daí, nestas condições reais, eis que o contrato de financiamento padece de nulidade.

Mas nada disso foi considerado aos olhos do nobre magistrado, aliás o magistrado não levou em consideração a questão do direito social de moradia, e nem as normas do Código de Defesa do Consumidor; para o julgador importou apenas o art. 15-A da Lei nº 4.380/64, permitindo expressamente “a pactuação de capitalização de juros com periodicidade mensal nas operações realizadas pelas entidades integrantes do Sistema Financeiro da Habitação – SFH”.

O art. 15-A da lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964, incluído pela Lei nº 11.977/09, permite a pactuação de capitalização de juros com periodicidade mensal nas operações realizadas pelas entidades integrantes do Sistema Financeiro da Habitação – SFH, e é o que bastou para o nobre magistrado negar a revisão e adequação das taxas de juros constantes do contrato de financiamento da casa própria.

Da decisão do nobre magistrado cabe recurso, sendo que este advogado não foge ao bom combate, e estaremos aguardando a decisão das instâncias superiores.

Por fim, algo que ficou bem claro, segundo a sentença do nobre magistrado, é que os juros compostos não incidem em contratos de financiamento de imóvel celebrados antes de 7 de julho de 2009, pois esta forma de capitalização somente foi permitida pela lei 11.977/09 e a partir de sua vigência, estando ai uma ótima oportunidade para revisão de contratos mais antigos de financiamento de imóveis.

Autor / Fonte: Rodrigo Silva Froes, advogado. Expert em Direito Imobiliário, atua na Advocacia Cível e Criminal há mais de 13 anos.

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