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quarta-feira, 6 de abril de 2011

Condomínios criam regras cada vez mais polêmicas e irritam os moradores

Não pode fazer barulho ou escutar música alta depois das 22h. Furadeira e salto alto, nem pensar. Vaso na janela, futebol no jardim, bagunça de criança, carro torto na garagem, lixo fora do horário podem ser alvo de multa. Pizza só na portaria. São muitas as regras que os condomínios adotam para garantir a segurança e a boa convivência entre os moradores. As medidas, no entanto, andam cada vez mais controversas


Barulhos, problemas de garagem e vazamentos encabeçam o ranking de reclamações, segundo o Secovi-SP, sindicato do mercado imobiliário. Proibições envolvendo bichos de estimação, crianças e bicicletas, então, viraram sinônimo de polêmica e todo mundo parece ter uma história para contar.


A engenheira Camila Guarnieri, 24, enfrenta um problema duplo no condomínio onde mora em Campinas (SP). Os animais não podem circular pelas áreas internas do residencial e não podem fazer barulho. “Eu não entendo. Se você compra uma casa em um condomínio é porque quer segurança. Eu preciso passear com a minha cachorra na rua, à noite, porque não posso circular por aqui”, reclama.


Quando mudou para a casa, sua boxer Fiona demorou para adaptar-se ao novo ambiente e a engenheira logo recebeu uma carta do condomínio dizendo que ela seria multada se o animal não parasse de latir. “Alguém multa meu vizinho porque a criança dele não para de berrar? Conversamos com a síndica e tivemos que comprar uma dessas coleiras que dão choque para ver se ela ficava mais quieta, coitada. Ainda bem que foi por pouco tempo”, lembra.


“Aqui no meu prédio, um morador conseguiu proibir as crianças de brincarem no parquinho, por causa do barulho. Isso no meio das férias escolares. Mas elas se organizaram, fizeram um abaixo-assinado e foram para a reunião de condomínio exigir o fim da proibição. Foram as primeiras a chegar e sentaram na primeira fila”, disse Maria da Graça Ribeiro, que mora em Santos (SP).


Já a escritora Ana Rüsche, 31, conta que seu prédio em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, não tem estacionamento para bicicletas e nem pensa em construir um. Por isso, ela precisa subir quatro andares de escada carregando a bicicleta, que usa para percorrer pequenas distâncias e evitar pegar o carro.


“Carrego no braço mesmo. Tenho uma de alumínio e a outra dobrável, que são levinhas, têm mais ou menos 13 quilos. Mas a gente tem que ter força de vontade para chegar em casa e subir tudo”, diz. “É uma pena, porque há cada vez mais carros na rua e é impossível estacionar por aqui após as 23h”.


Segurança extrema


As medidas de seguranças também dividem os moradores. Em um condomínio de São Paulo um aviso indica: “Proibido entrada com capacete". No prédio de Higienópolis, na região central da capital paulista, visitas precisam deixar nome e RG. Em Santos (SP), um prédio proibiu entrada de pacotes.


“Primeiro, a gente tinha que descer para pegar a pizza na portaria. Depois, as pessoas não podiam subir com pacotes pelo elevador. Aí, começaram a barrar tudo, tudo virou pacote suspeito. Até presente”, lembra Sonia Becker.


Os especialistas, no entanto, defendem que nenhuma regra de segurança é exagerada. “As únicas regras que devem ser mais rigosas são as de segurança. É melhor exagerar para mais”, analisa o vice-presidente da administração de condomínios do Secovi-SP, Hubert Gebara.


Regras inusitadas


Mas nem sempre as regras do prédio são fáceis de entender. Em um prédio da Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo, o estatuto diz que é proibido circular pelas áreas comuns usando... robe de chambre. Em outro, é proibido entrar com qualquer bebida, porque pode sujar o hall e quem for visto andando sem camisa leva bronca.


Em um edifício dos Jardins, toalhas penduras na janela são proibidas -- “principalmente nos kitnets”. E no edifício Louvre, a área da piscina, que fica na cobertura, é trancada a partir das 18h, o que impede os moradores de apreciarem a maravilhosa vista do centro de São Paulo durante o pôr-do-sol.


Outro prédio da região adotou uma sirene polêmica, usada para assustar travestis. “Achava que era algum tipo de alarme de carro, mas um morador antigo me contou que a sirene é acionada quando os travestis tentam usar a nossa calçada para ficar esperando os clientes ou quando estão fazendo muito barulho”, conta Débora Rodrigues, que mora ali. “Ela funciona diariamente, principalmente à noite, de segunda a segunda. Basta algum travesti começar a falar mais alto ou tentar usar a calçada como ponto, que o porteiro aciona”.


Já os moradores de um prédio em Moema, zona sul de São Paulo, viram o seguinte aviso afixado no elevador: “Lamentavelmente tem sido observada no chão da academia a presença de cuspe e escarros junto à esteira e à bicicleta. Por uma questão básica de higiene solicitamos que isso não ocorra”.


“É ridículo ter que ler isso. Mas, pelo visto, era necessário, né?”, comentou a psicóloga Juliana Marques, que mora no local.


Síndicos autoritários


Em muitos casos, as regras polêmicas são resultado de administradores megalomaníacos. Uma moradora de um condomínio da Chácara Klabin, também na zona sul, tem tanto medo do antigo síndico que prefere não ter seu nome divulgado. Ela conta que o morador administrou o prédio por oito anos e “pintou e bordou” durante o período, provocando sérios conflitos com os outros proprietários.


“Ele dizia abertamente que era o dono do prédio e se permitia adotar uma série de proibições por conta própria. Os adolescentes, por exemplo, não podiam sentar no sofá do hall, porque na cabeça dele iriam namorar ali. Ele também colocou tranca em todos os portões do condomínio para evitar que os jovens fossem até a piscina ou o bosque. Ele mexia com as minhas visitas, provocava”, lembra. “Tenho medo, porque ele é agressivo e pode partir para cima”.


Gebara, do Secovi, ressalta que casos de abuso de poder são muito comuns, embora o síndico seja um representante dos moradores e precise seguir a convenção do condomínio e o Código Civil.


“Ele não pode fazer o que bem quiser, não pode decidir as coisas sozinho. Tem que ter bom senso, ser educado e não pode se beneficiar do cargo. E se ele não for bom, troque”, adverte.


José do Amaral Nogueira Jr, presidente do sindicato dos síndicos de São Paulo (Sindsíndico), também diz que o problema é constante e precisa ser combatido. “É comum as pessoas confundirem as coisas e se sentirem donas do prédio. Elas não são profissionais e se perdem no meio da gestão", afirma. "Por isso, nós defendemos que a função de síndico deve ser profissionalizada. A pessoa precisar ser qualificada, passar por curso e se preparar. Até porque pode responder judicialmente pelas suas decisões”.

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