O momento das pechinchas pode ter passado, mas o chão ficou mais firme no mercado imobiliário internacional. Embora os preços já tenham subido bastante, especialmente nos Estados Unidos, a demanda continua a se acelerar com a melhoria das condições econômicas no exterior. E o mercado americano já não está mais sozinho na preferência dos brasileiros. Portugal e Espanha entraram no radar de investidores. Imobiliárias e consultorias especializadas em assessorar quem deseja adquirir propriedades fora do Brasil asseguram haver ainda espaço para valorizações de dois dígitos anuais em unidades residenciais nos próximos três anos, tanto em solo americano quanto europeu.
Dados da Florida Realtors, associação dos corretores imobiliários do Estado americano, mostram que o preço médio dos imóveis na região de Miami, embora tenha subido cerca de 30% desde o ponto mais baixo pós-crise de 2008, no fim de 2011, ainda está nos níveis de meados de 2002 e início de 2003. Ou seja, a janela de oportunidades ainda está aberta.
Apesar de ter parado de crescer, o ritmo de compra dos brasileiros se mantém forte na Flórida, em especial em Miami e Orlando. Segundo a Miami Realtors, associação dos corretores de imóveis do condado, os investidores daqui aparecem em segundo lugar entre os maiores consumidores estrangeiros de imóveis, com participação de 11%, mesma fatia de 2013, ao lado de argentinos. Em termos de valores, os cliente nacionais superam os demais compradores internacionais. Os brasileiros pagaram, em média, US$ 494,5 mil por propriedade em Miami neste ano, ante US$ 444 mil de todos os compradores de fora dos EUA.
Conforme Michel de Amorim, sócio da consultoria Drummond, com escritórios em Boston, Miami e Nova York, há uma grande procura de brasileiros por imóveis na faixa de US$ 500 mil a US$ 1,5 milhão na região de Miami. Para o especialista, embora muitos clientes demonstrem interesse em morar nos EUA, o foco principal ainda está no investimento. "Tem crescido, por exemplo, o interesse por imóveis comerciais, com objetivo de gerar renda em dólar. A demanda que temos recebido está direcionada para uma diversificação dos investimentos", afirma.
O cenário atual em Miami, um dos principais mercados no exterior para clientes brasileiros, no entanto, exige uma boa dose de pesquisa e seleção das oportunidades. "Existe chance de valorização, mas não em todos os projetos nem em todas as regiões. Em Miami há projetos nos quais o preço do m2 já está muito puxado", diz Cássio Faccin, sócio da consultoria Faccin Investments, sediada na Flórida, especializada em atender brasileiros interessados em investir nos EUA.
Segundo o especialista, o potencial de ganho com propriedades residenciais na cidade americana alcança entre 30% e 40% em três anos, conforme o empreendimento e a região. Entre os bairros com maior possibilidade de bons negócios hoje, Faccin cita Sunny Isles, Brickell e Miami Design Distric. "São as regiões que possuem os melhores projetos e onde há obras do governo e de fundos privados para renovação de infraestrutura."
Levantamento da Florida Realtors de setembro último, no entanto, mostra que os brasileiros têm preferido comprar imóveis em Orlando. A cidade dos parques de diversões, como os da Disney e de estúdios de cinema, atraiu 25% dos investimentos de clientes daqui em 2014. Miami aparece em terceiro lugar, com 14%, atrás dos 17% de Fort Lauderdale. Uma explicação é a maior atratividade dos preços na cidade líder em relação a Miami.
"Em Orlando, um apartamento de 140 m2 custa cerca de US$ 200 mil", diz Faccin. Com a cotação do dólar de ontem, o m2 sairia por R$ 3,6 mil. Além do preço menor que o de grandes cidades brasileiras, Orlando atrai compradores interessados em obter renda com a demanda por aluguel de temporada, acrescenta o consultor.
Para Renata Sirpo, diretora internacional da imobiliária Coelho da Fonseca, quem busca renda de aluguel deve considerar Orlando. "A cidade tem um potencial de locação muito acima da média de outras regiões." Renata explica que, enquanto áreas como Miami tem um potencial de ocupação para temporada de 50% sobre a quantidade de imóveis residenciais, Orlando tem uma demanda por aluguel turístico de 75%, com pico de 90% na alta temporada.
O professor William Eid Jr, coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV (GV-CEF), lembra os investidores que o câmbio não deve ser ignorado na hora de avaliar o investimento em imóveis no exterior. "Hoje a tendência é de desvalorização do real ante o dólar e existe a possibilidade de se ganhar com isso", diz. Mas, avalia o especialista, no longo prazo a variação da moeda pode trazer surpresas nem sempre agradáveis, em especial para aqueles que entraram no negócio no momento de maior apreciação do dólar.
Eid Jr vê oportunidades no mercado internacional, em especial nos países que sofreram mais com a crise europeia a partir de 2010, como Portugal e Espanha. "À parte questões cambiais, no longo prazo esse investimento tende a se valorizar. Esses países estão começando a sair de uma crise, então os preços dos imóveis estão atrativos", diz.
Para Marcella Freire, sócia da Quadratta Realty, que presta assessoria para brasileiros interessados em comprar imóveis na Europa, os mercados mais promissores naquele continente são os de Portugal e Espanha. "Nos dois países, há potencial de valorização dos imóveis de até 90% em dois anos", diz.
Dono de uma empresa de TI em São Paulo, o empresário Fábio (nome fictício), 41 anos, já adquiriu dois apartamentos em Lisboa, capital portuguesa. O primeiro, de 60 m2, foi comprado em 2008. A aquisição do segundo, de 50 m2, ocorreu neste ano. Fábio diz que em ambos os casos seu objetivo foi de diversificar suas aplicações. "Vi uma oportunidade porque o mercado de aluguéis em Lisboa começou a crescer com o aumento das taxas de financiamento."
O empresário afirma que conseguiu financiar parte dos valores, 60% de cada imóvel, por meio de empréstimos de bancos locais. "As taxas subiram muito em alguns anos. Em 2008, consegui um crédito com juros de 0,3% ao ano mais a variação da Libor. Neste ano, a taxa foi de 3,5% mais a Libor", conta.
Apesar de alta para os padrões europeus, taxas entre 3,5% e 4% são menos da metade das praticadas no Brasil, lembra Marcella, da Quadratta. Tanto que, conforme relata o empresário, o rendimento dos aluguéis obtidos com os apartamentos em Lisboa hoje é suficiente para cobrir as parcelas "e ainda sobra um pouco para amortizar a dívida principal".
Pela experiência do advogado Rafael Pistono, do escritório Vinhas e Redenschi, que trabalha junto com a Quadratta, os brasileiro têm portas abertas para obter crédito tanto em Portugal como na Espanha. "A gente tem conseguido taxas em torno de 4% ao ano e uma média de financiamento de 60% a 70% do imóvel investido", diz. Segundo ele, a garantia solicitada é a hipoteca, em que o próprio imóvel serve como proteção ao contrato, semelhante ao sistema de alienação fiduciária usado no Brasil.
A plataforma de consultoria para a compra de propriedades no mercado europeu, capitaneada pela Quadratta e pelo Vinhas e Redenschi, foi lançada há seis meses e, nesse período, apresentou aumento de 60% em volume de consultas. "Nos unimos na plataforma porque a demanda por informações sobre o assunto cresceu a partir da queda dr preços na Europa e da supervalorização aqui no Brasil em especial em São Paulo e Rio", afirma Pistono. O grupo conta ainda com a estrutura do banco BBM, com foco no segmento private.
O interesse de brasileiros pelos mercados de Portugal e Espanha ganhou impulso com a ajuda dos governos. Lançado em outubro de 2012, o "golden visa" permite que cidadãos não europeus consigam visto permanente de residência em países como Portugal, Espanha, Chipre e Grécia. Nos dois primeiros, com investimento imobiliário a partir de € 500 mil, é possível obter a licença. A exigência cai para € 250 mil no caso da Grécia e para € 300 mil no Chipre.
Na avaliação de Marcella, da Quadratta, embora o visto tenha elevado o interesse dos brasileiros em investir em Portugal e Espanha, o maior atrativo ainda é o preço. "Na faixa abaixo dos € 500 mil há muita procura. Dá para comprar imóveis em regiões nobres com € 2 mil o m2 [cerca de R$ 6,3 mil na cotação do euro de ontem]", afirma.
Fonte: Valor Econômico